Design as Art

Munari, Bruno

Design as Art

2008 London
Penguin Classics
Editora

Publicado pela primeira vez em 1966, o livro Design as Art de Bruno Munari é uma obra que explora a prática do design e a sua importância quotidiana. Neste livro, o designer aborda os conceitos de arte e design, e como estes acabam por ser sinónimos. Design as Art é, assim, uma compilação dos pensamentos do autor, originalmente publicados no jornal milanês Il Giorno, sobre a sua perceção do que é um objeto artístico, a relação entre funcionalidade e beleza e o papel do designer. Nesta obra podem ser identificadas 5 temáticas principais: o designer enquanto artista, comunicação visual, design gráfico, design industrial e design de investigação. 

Munari inicia o seu livro com o pensamento de que o conceito de star artist é um mito. O conceito de artista conceituado que apenas faz arte considerada intelectualmente superior, uma vez que é apenas apreciada por uma pequena camada da população, a camada considerada inteligente, deve ser ultrapassada. Esta obra, fruto do contexto socioeconómico em que foi publicada, retrata a sociedade ocidental do pós-guerra, marcada pela ascensão do consumismo. Por isto, Munari defende que um artista não deve estar assente num pedestal e deve estar disposto a desenhar um logotipo se tiver essa capacidade, dando o exemplo de um logotipo de um talho por ser um dos locais de comércio mais banais no nosso dia a dia. O autor descreve esta mudança de paradigma artístico como um abandono do romantismo – o artista deve ser alguém que utiliza a sua sensibilidade estética para responder às necessidades e exigências da sociedade, em vez de criar algo que apenas poucos vão compreender. Logo, a criação artística passa a existir de um paradigma exclusivo para um de fácil acesso. 

Esta obra está assente na premissa de que numa sociedade que muda cada vez mais rápido é necessário resgatar o contacto entre as pessoas e a arte. Para isto se concretizar, esta tem de chegar à população de forma generalizada

através da criação de objetos tão funcionais quanto belos. Para Munari, os únicos que conseguem concretizar esta ideia são os designers. São estes que conseguem aliar a beleza à funcionalidade. Enquanto designer industrial, Munari dedicou a sua carreira à estética de objetos comerciais de caráter puramente funcional. Desta forma, para o autor, a melhor estética que pode ser escolhida para um objeto funcional é aquela que maior facilita a sua função. 

A questão Será o Design Arte? é há muito debatida. E esta obra acaba por constituir uma boa contribuição a este debate intemporal, sobretudo por partir de um dos designers mais emblemáticos do século XX. No passado, havia uma diferença notável entre as belas-artes, a arte comercial, a arte pura e as artes aplicadas. Munari refere que antes uma máquina era feita por um engenheiro e separadamente decorada por um artista. Mas na década de 1960, estas distinções diluíram-se. A arte, segundo Munari, voltou novamente a ser uma troca, tal como era na Arte Antiga, em que os artistas criaram de forma a comunicar visualmente com a população como por exemplo através de frescos. Paralelamente, hoje em dia, é necessário alguém que esteja apto a comunicar visualmente com as pessoas para as informar de determinados temas. Entra assim o designer que, ao contrário de um artista puro, sabe construir algo visualmente apelativo com recurso a técnicas de produção, conhecimento de materiais e utilização de formas e cores não de forma subjetiva e por gosto pessoal mas de acordo com as suas funções psicológicas e o impacto que terão no consumidor/observador. Como Munari observa, “O designer é o artista da atualidade, não porque é um génio, mas sim porque trabalha de uma forma em que estabelece o contacto entre a arte e o público, porque tem a humildade e a capacidade de responder a quaisquer exigências feitas pela sociedade em que se insere, porque conhece o seu trabalho e as formas como resolver cada problema de design. E, finalmente, porque responde às necessidades humanas do seu tempo e ajuda pessoas a resolver determinados problemas sem preconceitos estilísticos ou conceitos falsos do que é a dignidade artística derivada da divisão das artes (p.32)”.1 

Um dos exemplos que o designer destaca na sua obra é o design de um candeeiro prismático (prismatic lamp). Segundo o autor, um bom designer ao conceber um objeto de grande dimensões, deve sempre ter em consideração o momento prévio ou posterior à sua utilização, isto é, o transporte e também o armazenamento. Já há vários objetos que podem ser montados e desmontados. No entanto, exigem muitos parafusos, o que é excessivamente complexo para alguns utilizadores. O ideal é pensar de modo a que os objetos se montem sozinhos sem dificuldades. Em muitos casos isto é possível – os designers devem saber trabalhar através e com a gravidade – tal como acontece com o candeeiro prismático. Composto por três folhas de poliéster e fibra de vidro presos a uma moldura, este objeto consegue ser guardado numa caixa e medir 2,5 cm de altura. Ao ser pendurado, o seu peso faz com que assuma o seu formato de candeeiro e, consequentemente, a sua função. O design deste objeto foi, deste modo, possível porque um designer o simplificou ao máximo (regra a que Munari dá o nome de “subtrair em vez de adicionar”). Para o autor, um bom design exige encontrar a essência do objeto que se está a criar e para isso acontecer devem ser retirados todos os elementos supérfluos. O melhor candeeiro é aquele que combina várias funções num só elemento, cujo design é o mais simples, cujo armazenamento exige pouco espaço, cuja produção demora o menor número de horas possível. 

Estes pensamentos de Munari servem como base de toda a obra e vão sendo repetidos e fundamentados ao longo da mesma. A sua organização é feita de modo a não se tornar repetitiva ou cansativa. Encontra-se dividida em 5 capítulos: Design as Art, Designers and Stylists, Visual Design, Graphic Design e Research Design. Os últimos 4 capítulos, que são também os mais extensos e desenvolvidos, encontram-se subdivididos em vários subtemas que os organizam por temas mais específicos e exemplos práticos concretos, os quais servem de fundamento ao que o autor explica anteriormente. Esta subdivisão permite que a sua leitura seja fácil e ritmada. 

Para além disso, a variada utilização de exemplos, quase sempre acompanhados de contextualizações e de imagens e esquemas ilustrativos, permitem ao leitor visualizar o que lhe está a ser dito e perceber mais facilmente a mensagem de Munari. A utilização de exemplos que à partida nada têm a ver com o design acabam por ser surpresas positivas e interessantes para o leitor, mostrando realmente como o design é tão natural nas nossas vidas como uma rosa ou ervilhas, exemplos incluídos pelo autor. No entanto, em certos exemplos o autor alonga-se em demasia, tornando-se redundante e quebrando, consequentemente, o ritmo de leitura previamente alcançado.

Outro aspeto que constitui uma mais-valia para a obra é a linguagem: Design as Art é escrito de uma forma coloquial e dotado de uma simplicidade linguística que faz com que a obra seja facilmente lida e compreendida por várias faixas etárias, por designers e artistas quer profissionais quer amadores, e até por pessoas fora destas áreas. 

A ideia de que os designers são essenciais numa sociedade cada vez mais consumista em que as mudanças são constantes e cada vez mais rápidas pode ser identificada nos nossos dias de hoje. Atualmente, para satisfazer um consumo de massas, o design é essencial. Os designers trabalham como motores de um sistema em que o belo é essencial na comercialização e consumo dos objetos. Por isto, a descrição que Munari faz do papel dos designers continua atual. Contudo, sobretudo no capítulo do design gráfico podemos perceber a década em que este livro foi escrito, ou seja, antes da era digital e da utilização quase universal do computador. As tecnologias descritas pelo autor são agora pouco utilizadas, o que para um estudante ou designer gráfico atual é pouco útil, excepto como registo histórico da prática. No entanto, o próprio autor alerta para este facto quando diz que a arte deve sempre adaptar-se e mudar consoante o passar do tempo. Podemos por isso atribuir a esta obra tanto o caráter de desatualizada como de intemporal. Design as Art é assim uma obra contraditória na sua própria importância. As ideias de Munari podem parecer demasiado óbvias e superficiais para um profissional da área, o que causa dúvidas se deve ser uma obra recomendada a todos os estudantes de design. No entanto, para curiosos poderá ser uma boa introdução à importância do design na sua vertente mais comercial.

1 Citação traduzida pela autora da recensão. Original: “The designer is therefore the artist of today, not because he is a genius but because he works in such a way as to re-establish contact between art and the public, because he has the humility and the ability to respond to whatever demand is made of him by the society in which he lives, because he knows his job, and the ways and means of solving each problem of design. And finally because he responds to the human needs of his time, and helps people to solve certain problems without stylistic preconceptions or false notions of artistic dignity derived from schism of the arts.”

Recensão de:
Mafalda Vaz

Licenciatura em Design de Comunicação, FBAUL

Disciplina: Estudos em Design, 2022-23