Design as Future-Making

Yelavich, Susan (ed.)

Design as Future-Making

2014 New York
Bloomsbury
Editora

Publicado pela Bloomsbury em 2014, Design as Future-Making é um livro que não pretende ser porta-estandarte de uma visão exclusiva do design, nem pretende ser conveniente de forma a encontrar um consenso entre os leitores. Quer antes mostrar diferentes perspetivas da prática do design que convergem, essencialmente, numa filosofia de procura ativa de reformas por um mundo mais justo e sustentável, dando assim início à construção do futuro. Para isso, é importante que o design seja não só um veículo de locomoção na temporalidade mas que nos permita, dado o contexto, avaliar o passado e o presente através de um espírito crítico que redefina novas problemáticas. É importante também que consiga estabelecer uma ponte espaço-tempo e que utilize a materialidade na viabilização de soluções.

Esta obra é um compilado de vários ensaios escritos por diferentes autores, o que garante uma pluralidade de vozes e mostra uma estrutura coerente com a ideia, repetida ao longo do livro, de o design ser um processo de aprendizagem que é ampliado com a partilha de experiências. Além disso, alguns dos ensaios não se focam simplesmente em dissertações teóricas, apresentando exemplos de projetos que fazem questionar qual o verdadeiro potencial do design como ferramenta de empoderamento das comunidades. Para esta obra foram ainda reunidos autores que relacionam o design com outras áreas, tais como a ciência, a arquitetura e a moda. Também esta troca de conhecimento proveniente da interdisciplinaridade corrobora a importância da aprendizagem passada no livro.

Susan Yelavich, uma das autoras e editoras da obra, é responsável por introduzir os leitores ao atual estado do design. Professora de Estudos em Design na Parsons School of Design em Nova Iorque, Yelavich apresenta-nos uma visão crítica da apatia demonstrada pelo design nos últimos anos, fruto de uma uniformização conveniente ao mercado. Este comodismo evidenciado pela autora é algo que já foi abordado por outros autores como Andrew Blauvelt, que partilham da ideia de que o design deveria partir de convicções e não adotar uma postura estóica. Assim, Yelavich estabelece a diferença entre a generalidade do design atual e aquele que é evidenciado ao longo da obra, que pode ser resumida pela diferença de atuar “in and on the world” (p. 12). Estruturalmente, o livro é dividido em três capítulos que assentam cada um num princípio base do design como prática social.

Primeiramente, o leitor é introduzido ao capítulo ‘Crafting Capacities’, escrito por Barbara Adams que também é editora do livro e professora assistente na Parsons School of Design, na disciplina de Design e Justiça Social. Aqui, a autora começa por explicitar o conceito de “crafting”, o qual é definido como a arte de compreender a potencialidade dos materiais não só como agentes isolados mas como agentes que podem afetar o meio envolvente. Tal só é conseguido através de um processo de constante aprendizagem e troca de conhecimento. Isto permite desmistificar a ideia pré-concebida de que o design é uma atividade individual que vive através do autor ou que é centrada num produto material. Pelo contrário, o design tem como principal objetivo suscitar a reflexão e o espírito crítico, sendo os materiais apenas um veículo para tal através das formas como suscitam sentimentos, ideologias e possibilidades. 

Um dos ensaios deste capítulo que consegue melhor encapsular esta mesma ideia é ‘Unmapping’, do autor Sean Donahue. Nele, o leitor é apresentado ao projeto LA Has Faults, conduzido pelo próprio autor, que tem como objetivo compreender como é que o design pode ser um facilitador do debate entre indivíduos com diferentes princípios e contextos sociais. Este debate pressupõe ainda que estes indivíduos consigam separar a sua individualidade do elemento “comunidade” que tem os seus próprios interesses e necessidades. Este projeto, iniciado em Westlake, em Los Angeles, pretendeu criar um espaço de informação e de suporte onde se pudesse preparar a comunidade local, conhecida pela sua diversidade cultural, para situações de calamidade. Para isso, o projeto foi dividido em duas fases. Numa primeira instância, começou por se construir num parque central da zona, através de blocos, palavras – em inglês e espanhol – sugestivas a terramotos, as quais pudessem ser lidas de vários ângulos e distâncias, e assim, atrair os espectadores para o projeto. Isto por si só demonstra o domínio da materialidade invocado por Barbara Adams, pois cada característica da construção foi pensada: desde o local da construção, à altura das letras, à linguagem, à perspetiva da construção e até mesmo o tempo de montagem e desmontagem. Tudo isto para servir o propósito de chamar a atenção dos cidadãos de forma a estes poderem contribuir com as suas experiências para o debate sobre o tema, não só com os organizadores do projeto mas principalmente com a comunidade. Numa segunda parte do projeto, criou-se um espaço físico onde o debate pudesse continuar preservando a equidade. Mais uma vez, todo o design do espaço teve especial atenção à interação pessoas-materiais, que pode ser evidenciado, por exemplo, pela criação de bancos mais baixos que o normal, de forma a evitar a influência de status social na discussão, o qual é por norma demonstrado na roupa. O título sugestivo do ensaio demonstra assim que o trabalho do designer é muito mais de reinterpretação e reconstrução com o objetivo de desenvolver mecanismos que permitam às comunidades satisfazer as suas próprias aspirações.

O capítulo ‘Shifting Geographies’ apresenta os desafios que o design tem de enfrentar num mundo em constante mutação, onde os designers necessitam de analisar humildemente as problemáticas com que se deparam à luz do contexto atual, mas que também consigam antever as alterações que poderão estar por vir. Para exemplificar isto, Susan Yelavich utilizou o exemplo do município de Sępólno, localizado na Polónia. Entre 1919 e 1935, Sępólno adotava o nome de Zimpel e dizia-se que as suas ruas tinham sido desenhadas na forma da águia do brasão de armas da Alemanha, território cujo qual a localidade pertencia na época. Depois da II Guerra Mundial, esta localidade foi anexada à Polónia e alterou o seu nome. Isto despoletou novas teorias sobre o design das ruas de Sępólno, uma vez que após a anexação, passou-se a teorizar que o desenho tinha sido antes inspirado na águia do brasão de armas da Polónia, sugerindo assim que o território tinha origem polaca. Na verdade, a resposta a esta questão pouco importa, e a autora apenas pretende demonstrar que a mudança do contexto em que uma comunidade se insere também altera a percepção do design. 

Nesta secção do livro, destacaria o ensaio ‘Returning Duchamp’s Urinal To The Bathroom? On The Reconnection Of Artistic Experimentation, Social Responsability, And Institutional Transformation’, escrito por Teddy Cruz, que chama a atenção para a marginalização que teve origem no crescimento das grandes metrópoles nos últimos anos. Cruz sugere que, tal como mencionado na introdução, existe uma subordinação ao sistema na classe dos designers e que cabe a eles reconectar estas comunidades com as instituições que os negligenciam através do “design of conditions” (p.148). Seguindo a mesma perspetiva que a célebre frase “Com grandes poderes, vêm grandes responsabilidades”, o facto de o design poder ser um catalisador da mudança para um mundo mais justo, confere-lhe uma responsabilidade social que já não o permite adotar uma postura apolítica. Segundo o autor, os países da América Latina têm-se destacado no que toca a projetos urbanísticos reformadores que trabalham em conjunto com a comunidade, o que comprova que um processo de criação que parte de zonas de escassez acaba por ter uma melhor visão em termos de praticabilidade. Apesar dessa menção, e das duas imagens presentes no ensaio, acredito que uma explicação mais descritiva dos projetos ilustraria melhor o apelo do autor para um design ativista.

Por fim, o capítulo ‘Up-ending Systems’, introduzido por Barbara Adams, aborda os sistemas em que estamos inseridos atualmente. Estes já não são tão estáveis e já não nos garantem as mesmas condições de outros tempos, no entanto, existe uma tendência para adotarmos uma postura de subordinação em relação a estes sistemas devido ao conformismo e ao medo, em vez de derrubarmos os sistemas que nos oprimem. A transformação começa quando pomos em perspetiva os padrões que são seguidos por estes sistemas. Isto faz com que este capítulo seja aquele que mais procura a inovação e mais traz novas ideias novas para o debate. 

Tendo em conta que vivemos num sistema consumista, que entra em conflito com o ideal sistema sustentável, a ideia de eliminação no design, apresentada no ensaio ‘Design Away’ de Cameron Tonkinwise, torna-se numa das mais pertinentes e disruptivas do capítulo. Normalmente, o design é associado a um processo de criação. No entanto, o autor faz-nos repensar nessa visão simplista, demonstrando que a destruição também pode ser uma ferramenta estrategicamente utilizada para transmitir uma nova ideologia. Se nos lembrarmos da ideia de materialidade do primeiro capítulo, percebemos que ao utilizar os recursos na criação de novos materiais estamos a alterar, e por sua vez a destruir, as interações que estes tinham no seu ecossistema. Além disso, os recursos são muitas vezes limitados: se quisermos adotar um design sustentável é importante pensar se o valor da criação compensa as implicações da destruição.

Em suma, ‘Design as Future-Making’ é uma compilação de várias ideias e projetos que se regem pelos princípios do design como prática social. Serve não só de inspiração para novos designers que pretendem ter uma participação ativa na construção de um futuro justo e sustentável, mas também serve de abre-olhos para outros leitores que não estão tão dentro da área e tenham uma visão rasa do design, como é o meu caso. Para isso, a obra apoia-se numa estrutura coerente e segura, apesar da divisão dos seus capítulos não acrescentar muito e poder mesmo acabar por diminuir os ensaios neles contidos ao tentar rotulá-los. Apesar deste aspecto menos positivo, nada põe em causa a pertinência desta obra para o estudo do design.

Recensão de:
Sofia Santos

Licenciatura em Engenharia Electrotécnica e de Computadores, IST

Disciplina: Estudos em Design, 2022-23